quarta-feira, 1 de abril de 2015

As novelas e a diminuição da natalidade no Brasil




Basta uma personagem na novela da Globo usar esmalte azul para encontrarmos na semana seguinte milhares de mulheres de todas as classes sociais usando esmalte azul. Esse mimetismo já é bem conhecido, mas podemos pensar além dos produtos: que comportamentos são introduzidos na sociedade a partir de uma novela? Que peso tem um autor, diretor e ator de novela para mudar o mundo?
Um artigo acadêmico publicado em 2008 por Eliana La Ferrara, Alberto Chong e Suzanne Duryea com o título Soap Operas and Fertility: Evidence from Brazil, estudou a fundo a relação entre novelas e a diminuição no número de filhos na família brasileira.

O estudo analisou somente as novelas da Rede Globo e cobriu o período de 1970 a 1991. Descobriu que as mulheres que viviam nas áreas com sinal da Globo tiveram uma queda muito forte na fertilidade. O impacto é mais forte nas pessoas de condição social mais modesta e nas mulheres acima de 30 anos. Demonstra também que foram as novelas e não os programas de televisão que influenciaram a mudança no comportamento da família.
Pesquisando a estrutura das novelas, o estudo descobriu que as famílias que aparecem nas tramas tinham muito menos filhos do que a família real brasileira.


Enquanto o país tem um nível de ensino muito rudimentar (basta pensar que 34% dos universitários brasileiros não possuem um grau pleno de alfabetização funcional), 90% dos lares tem uma televisão. Enquanto o ano letivo tem 200 dias (na teoria), as novelas ocupam mais de 300 dias.
A taxa de fertilidade por mulher no Brasil teve a queda mais acentuada no mundo, ultrapassando a da China (onde o governo introduziu a política do filho único, a esterilização e o aborto compulsório). Em 1960 havia 6,3 filhos por mulher no país; em 1970 havia 5,8; em 1991 apenas 2,9. Atualmente, em boa parte do nosso território, já estamos abaixo da taxa de reposição que é 2,1.
O perfil de 115 novelas da Globo indica que 72% dos principais personagens femininas, com idade inferior a 50 anos, não tinham nenhum filho. Sendo que as outras 21% tinham apenas 1 filho. Se consideramos apenas as heroínas que estão casadas nas novelas da Globo temos que 41,2% não tem filhos; 33,3% tem apenas 1 filho e 20,1% tem 2 filhos. Isso distorce totalmente a realidade.
Para piorar, a heroína além de não ter filho é rica e feliz. Em 1994 um estudo com mulheres que assistem novelas pediu que elas descrevessem a típica família que aparece na tevê e a típica família brasileira. Essas mulheres responderam que a família na novela é pequena, rica e feliz; a família real é maior, tem mais filhos e tem cara mais triste.
 A influência, logicamente, não se atém ao número de filhos. Vai para o casamento, divórcio e traição. O estudo contabilizou que apenas 27% das heroínas das novelas com 50 anos ou menos são casadas e 12% são divorciadas ou separadas (deve-se ter em conta que isso cobre um período anterior a lei do divórcio e ao crescente número de separações e coabitações). Das casadas, 42,3% traem seus maridos na novela.

Contar uma história é sempre a melhor forma de transmitir algo para as pessoas. Isso pode ser usado para o bem, ou como neste caso, para o mal. 

Artigo do blog: O Correio Chegou.


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